Os próximos passos da Câmara dos Deputados no
processo de impeachment da presidenta Dilma Rousseff só serão dados na
próxima segunda-feira (21). Depois da decisão do Supremo Tribunal
Federal (STF), que invalidou a eleição da chapa avulsa formada por
deputados de oposição ao governo, o presidente da Casa, Eduardo Cunha
(PMDB-RJ), convocou os líderes partidários para uma reunião às 17h de
segunda-feira.
Assessores não descartam que
Cunha já tenha iniciado algumas conversas, mas afirmam que nada será
definido antes da reunião de líderes. Um
dos acertos entre as lideranças será a lista de deputados indicados
para compor a comissão especial que vai analisar o processo.
No
julgamento, os ministros do STF analisaram cada um dos mais de dez
pontos questionados em uma ação proposta pelo PCdo B sobre o andamento
do processo de impeachment na Câmara e decidiram que a comissão tem de
ser composto por representantes indicados pelos líderes dos partidos,
escolhidos por meio de chapa única. Outro entendimento da Corte foi que,
mesmo se tratando eleição sobre assunto interno da Câmara, o
procedimento deve ser aberto.
Nos
últimos dias, foi esta composição das listas que motivou um racha no
PMDB na Câmara. Insatisfeitos com os nomes apresentados pelo líder,
Leonardo Picciani (RJ), para a comissão, uma ala do partido reuniu as
assinaturas necessárias para tirar o parlamentar do cargo e conseguiu
manter na liderança, durante oito dias, o deputado Leonardo Quintão
(MG). A substituição foi justificada porque esses peemedebistas acusaram
Picciani de formular uma lista com base em orientação do Palácio do
Planalto, e não pelo acordo firmado pela bancada de uma relação
equilibrada com quatro nomes favoráveis e outra metade contra o
impeachment.
Em uma reviravolta na última
quinta-feira, Picciani conseguiu o apoio dos 36 deputados do PMDB e foi
reconduzido ao cargo. O retorno do parlamentar fluminense à liderança
foi conseguido depois que três deputados manifestaram mudança de opinião
– Jéssica Sales (AC), Vitor Valim (CE) e Lindomar Garçon (RO) – e pelo
retorno à bancada de alguns filiados que ocupavam cargos executivos no
estado do Rio de Janeiro, entre eles, Marco Antonio Cabral, que era
secretário de Estado de Esporte, Lazer e Juventude do estado, e Pedro
Paulo Carvalho, que era secretário municipal da Casa Civil do Rio de
Janeiro.
A recondução de Picciani à liderança
ainda pode ter desdobramentos. Peemedebistas que criticam a proximidade
do líder com o governo afirmam que não são representados pelo
parlamentar. O impasse pode respingar na votação da comissão em
plenário. Como o STF definiu que as indicações serão feitas por líderes,
a lista será submetida a voto, mas, dividido, o PMDB pode reunir forças
para não aprovar os nomes do colegiado.
Eduardo
Cunha alertou que esta situação não foi prevista pelo Supremo e disse
ter dúvidas sobre o que fazer no caso de os nomes indicados pelos
líderes partidários não serem aprovados pelo plenário da Câmara.
Especialista
em direito constitucional e processo legislativo, o professor da
Universidade de Brasília (UnB) Mamede Said Maia Filho disse que o
Supremo resolveu vários questionamentos jurídicos e políticos com a
decisão de ontem. “As regras sobre o processo ficaram claras e
aplicáveis, não apenas ao momento atual, mas daqui para a frente.”
Segundo
professor, mesmo que tenha desagradado a alguns, a Corte analisou “mais
profundamente” o processo de impeachment, na comparado com a decisão
tomada em 1992, quando julgou o processo do então presidente Fernando
Collor. “O Supremo buscou resguardar o entendimento, mas com mais
profundidade. No momento atual, considerou alguns dispositivos
inconstitucionais e foi mais fundo, porque eram mais de 10 pontos, que
foram enfrentados um a um. Agora pelo menos temos um roteiro lógico a
ser seguido”, afirmou.
Para Said, questões
como a do voto aberto e da indicação dos nomes para a comissão especial
do impeachment pelos líderes partidários eram as “de menor relevância”.
Para o professor, o ponto forte na decisão foi o que ampliou o papel do
Senado e esvaziou a participação da Câmara na apreciação do processo.
“Com um Congresso bicamera,l tinha que haver equilíbrio de
responsabilidades. No entanto, a decisão do Supremo dá primazia ao
Senado, e a Câmara passa a ter papel decorativo. O melhor caminho seria a
Câmara analisar a admissibilidade e o Senado decidir sobre o mérito.
Ainda assim, o Senado continuaria com uma responsabilidade maior.”
Os
ministros do STF decidiram que o Senado não é obrigado a prosseguir com
o processo de impeachment se decidir que não tem procedência. Na
prática, mesmo que o plenário da Câmara aprove, por dois terços dos
parlamentares - 342 votos – a denúncia, os senadores podem arquivar o
caso e evitar que Dilma seja afastada do cargo, por 180 dias, como prevê
a lei.
Said disse que a situação de Eduardo
Cunha, acusado de receber propina para viabilizar negócios da Petrobras e
de manter contas secretas no exterior, pode ter sido um dos fatoress
que motivaram a decisão do Supremo que reduziu o papel da Câmara. “A
presença de Cunha à frente tira muita a legitimidade do processo. De
certa maneira, isso interferiu na decisão, mesmo não tendo sido
integralmente por isto, mas o ministro Barroso fez referência, várias
vezes, a manobras e jogos durante procedimentos da Casa, ao sabor das
circunstâncias, fazendo menção indireta à condução de Cunha”, afirmou.
Diante
da retomada de todo o processo, Said evitou fazer previsões. Para o
especialista, o futuro do governo é incerto, diferentemente do que
ocorreu em 1992. “Com Collor havia consenso, entre os partidos e por
parte da população. Na época, a questão nem foi aprofundada como agora
por isso. Mas agora a questão é muito polêmica. Apesar do
enfraquecimento, o governo segue tendo poder e o PT continua sendo um
partido com influência”, afirmou.
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