Sobre responsabilidade e culpa
Ultimamente tenho sido procurada por alguns amigos sobre
minha versão em relação à municipalização do Hospital Maria Amélia Santos
(HMAS), enquanto Secretária Municipal de Saúde na época. A curiosidade dos
amigos que me procuraram não foi em vão, mas resultado das colocações
midiáticas do atual Prefeito, Chiquinho Ferreira, segundo o qual a
municipalização do HMAS teria sido uma irresponsabilidade da gestão municipal,
que agiu por questões políticas (SIC).
DEISE BARBOSA |
Sobre essa afirmação, temos que dialogar sobre
responsabilidade legal e objetiva. Enquanto gestores municipais da saúde, temos
responsabilidade legal sobre a
execução da assistência à saúde da nossa população, estabelecida pela
Constituição Federal de 1988 e pela Lei Orgânica do SUS. Por outro lado, o
nível estadual, que historicamente assumia grande parte da oferta direta dos
serviços assistenciais de saúde, com a implementação do principio da
descentralização da gestão e das ações de saúde, passou a repassar aos municípios
os postos de saúde e os hospitais de pequeno porte que estavam sob sua
condução, mantendo sob gestão estadual apenas os hospitais de médio e grande
porte, com abrangência regional e com serviços de maior complexidade. Movimento
semelhante aconteceu na área da educação, com a municipalização de diversas
unidades escolares de ensino fundamental, que corresponde a um nível de ensino
sob responsabilidade dos municípios. Em São Felipe, por exemplo, tivemos a
municipalização dos colégios Renato Medrado e Presidente Médici.
Além disso, muitos amigos irão recordar que no ano de 2002,
ainda sob gestão do Estado, o HMAS passou por um agravamento da sua condição de
funcionamento, com estrutura física precária, sem garantia de médicos em todos
os plantões, com falta de materiais e medicamentos. Recordo que a população e
os servidores estaduais lotados no hospital iniciaram alguns movimentos de
protesto contra essa situação, cujo ápice aconteceu após o óbito de duas
pessoas em um curto período de tempo, por conta da falta de um pronto
atendimento de emergência. Lembro que esse movimento contou com a presença do
Sindsaúde, que motivou uma visita de reinvindicação à Comissão de Saúde da
Assembleia Legislativa da Bahia, com a pauta de municipalização da unidade
hospitalar. O que remete à responsabilidade
objetiva com a população da nossa terra, que estava sofrendo e morrendo
pela falta de assistência médica nos casos de urgência/emergência.
Dai que decorre uma reflexão sobre responsabilidade e culpa. Realmente, assumir a responsabilidade com
a municipalização de uma unidade hospitalar, com toda a demanda de atribuições
e custos que esse tipo de serviço produz, não é pra qualquer gestor não. Só
para os que tem responsabilidade para com a população, fibra para assumir essa
decisão, garantindo os investimentos necessários para manutenção de um serviço
de qualidade, e vontade de trabalhar pela saúde do povo. Seu Rozálio e eu assumimos essa responsabilidade e foram dias de
muito trabalho, diuturnamente, com o apoio de toda a briosa equipe da
Secretaria Municipal de Saúde e parceria com as demais secretarias de governo.
Além da priorização nos investimentos para a saúde, que ocuparam 21,38% dos
recursos próprios do município investidos em saúde no ano de 2003, que
correspondeu ao ano da municipalização. Percentual que chegou a 24,87% dos
recursos próprios aplicados com saúde no ano de 2008, sendo que o mínimo
exigido legalmente para os municípios é 15%. A título de exemplo, a atual
gestão, até o segundo bimestre de 2016, investiu apenas 8% dos recursos
próprios com saúde, segundo do SIOPS/MS.
Como resultado dessa ousada decisão colhemos a aprovação da
população sanfelipense, que sempre reconheceu e valorizou o trabalho realizado
na área da saúde, durante a gestão de Seu Rozálio, garantindo sua reeleição não
por 25 votos, mas com uma margem expressiva de quase mil votos. Os resultados
do trabalho realizado no HMAS, durante a nossa gestão, são facilmente observados
nos bancos de dados do Ministério da Saúde, disponíveis para todo e qualquer
cidadão que queira confirmar. Por meio desses dados, é possível comprovar que o
HMAS funcionou de forma resolutiva, com boa produtividade hospitalar, inclusive
realizando cirurgias e procedimentos obstétricos, incluindo partos cesarianos
(Figura 1) e um volume considerável dos partos normais da nossa população
(figura 2), produtividade que entrou em declínio logo em seguida. Chegamos a
realizar 99 cirurgias no ano de 2004 e 128 partos normais em 2005.
Figura 1- HMAS - Número de internações
por especialidade x ano
Fonte: MS/Tabwin/SIH/SUS, julho de
2016.
Figura 2 - HMAS -
Partos Normais realizados por ano
Fonte: MS/Tabwin/SIH/SUS, julho de
2016.
Por outro lado existe a culpa,
atributo utilizado pelos gestores que não tem competência e nem disposição para
trabalhar e preferem se eximir das suas responsabilidades, designadas pela
população por meio do pleito eleitoral a que se submeteram, procurando culpados
pela sua ineficiência. Ora é o Estado que deveria manter sua responsabilidade
com uma estrutura física cedida há mais de 10 anos, tendo o Estado destinado um
recurso de 700 mil reais em 2014 para reforma da estrutura física do HMAS que a
atual gestão não soube executar (Figura 3), ora é o ex-gestor que foi
irresponsável por ter colocado o hospital para funcionar para o povo.
Figura 3 – Notícia
sobre convênio de reforma do HMAS, 2014
Fonte: JC Radialista, julho de 2016.
Ora, ora, ora... militante do SUS
e técnica da área de saúde que sou, só tenho uma coisa a dizer aos meus amigos
que me perguntam sobre o nosso querido hospital. Saúde pública se faz com
coragem, humanização e muita vontade de trabalhar.
Deise
Barbosa
São Felipe, 15/07/2016
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