Brasil tem avanços na infância, mas ainda há 27 mi sem direitos básicos

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Para a Unicef, a situação deixa claro como é preciso investir em políticas integradas. Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
Ao mesmo tempo em que registrou avanços em indicadores da infância nos últimos 30 anos, o Brasil ainda tem cerca de 27 milhões de meninos e meninas de até 18 anos sem acesso a pelo menos um direito básico.
Também vê risco de reversão de algumas conquistas, caso da queda recente em indicadores de vacinação, o que colaborou para o retorno do sarampo, e do aumento da mortalidade infantil.
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Enquanto isso, vê surgir alertas sobre desafios não previstos em décadas anteriores, a exemplo do aumento do número de suicídios de crianças e adolescentes e problemas como bullying e cyberbullying.
A conclusão é de relatório da Unicef divulgado nesta terça-feira (12) sobre os 30 anos da Convenção sobre os Direitos da Criança, tratado que envolve 196 países, entre eles o Brasil, e considerado como o acordo de maior adesão no mundo.
“Foi um tratado que passou a considerar a criança como sujeito de direitos. Antes, era vista como propriedade do pai ou objeto de caridade”, afirma Florence Bauer, representante da Unicef no Brasil.
Segundo ela, o Brasil teve avanços significativos no período, caso da redução da mortalidade infantil e do aumento do acesso à escola. Mas também enfrenta desafios -que não são poucos.
Um exemplo elencado no relatório é que, de cerca de 57 milhões de crianças e adolescentes no país, 27 milhões não têm todos os seus direitos respeitados, como o acesso a educação, informação, água, saneamento, moradia e proteção contra o trabalho infantil.
Também é alto o número de homicídios de crianças e adolescentes. A cada dia, 32 meninos e meninas de 10 a 19 anos são assassinados no país. Em 2017, ano dos dados mais recentes disponíveis, foram 11.800 mortes. A maioria das vítimas são meninos negros, pobres, que vivem nas periferias e áreas metropolitanas de grandes cidades. “É uma das áreas em que não houve avanço”, diz Bauer.
Só nos últimos dez anos, foram 191 mil vidas de crianças e adolescentes perdidas por homicídios, de acordo com cálculos inéditos do Unicef.
“Temos uma situação no Brasil que é mais perigoso ser adolescente que adulto. Tem mais probabilidade de ser morto se for adolescente”, afirma Bauer, para quem os números mostram um cenário alarmante. “É um número maior do que em países em situação de guerra”, compara.
Para a Unicef, a situação deixa claro como é preciso investir em políticas integradas, com foco sobretudo em áreas mais vulneráveis.
Outros indicadores expressam esse desafio. Apesar de avanços, como o aumento na faixa etária escolar, o Brasil ainda soma 2 milhões de crianças e adolescentes fora da escola -destes, a maioria vem de famílias de baixa renda.
“Precisamos valorizar e capacitar o professor. E ter uma escola mais atrativa, com currículo que seja adaptado ao que o adolescente precisa para entrar no mundo do trabalho”, sugere Bauer.
Na saúde, o recente aumento nas taxas de mortalidade infantil e a queda em índices de vacinação também voltaram a acender um alerta para o risco de reversão de conquistas do período.
Entre 1990 e 2017, a taxa de mortalidade infantil passou de 47,1 casos a cada mil nascidos vivos para 13,4 casos a cada mil nascidos vivos. No último ano, porém, um “repique” nessa curva de dados chamou a atenção de especialistas.
O mesmo ocorreu para as taxas de vacinação, o que levou ao retorno do sarampo. O Ministério da Saúde diz que dados de 2018 já apontam sinais de melhora, mas que o desafio persiste.
Novos desafios
O relatório chama a atenção ainda para desafios emergentes e não previstos no tratado que marca a Convenção sobre os Direitos da Criança, adotada em 1989.
Um dos principais está relacionado à saúde mental de crianças e adolescentes. Nos últimos dez anos, houve aumento nos registros de suicídio entre esse grupo no país -passou de 714, em 2007, para 1.047, em 2017.
“O aumento de suicídios é a parte mais visível e trágica de um problema que é muito mais amplo. Precisamos de mais dados e estudos para saber quais são as causas”, diz Bauer. “Precisamos também de profissionais mais preparados para identificar os sinais.”
A Unicef também elenca entre os pontos que precisam de maior atenção questões como bullying e cyberbullying.
“É um desafio novo que não existia no momento em que foi estabelecida a convenção”, diz a representante, que também recomenda estudos e ações para evitar outros problemas, como abusos e exploração de crianças online.
O aumento no número de migrações e a proteção da infância nesse cenário é outro desafio emergente, segundo o relatório.
O documento cita como exemplo o fato de que, até julho de 2019, 200 mil venezuelanos haviam procurado refúgio no Brasil -destes, 30% eram crianças e adolescentes. (Folha Press)

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