Decisão do STF valida lei baiana que limita publicidade infantil

 

A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de que é constitucional a lei 13.582/16 da Bahia, que proíbe a publicidade dirigida a crianças de alimentos e bebidas pobres em nutrientes, tem repercutido entre pais, mães, professores e especialistas. A medida é vista como uma forma de proteger o público infantil da persuasão das propagandas e de combater a obesidade infantil.

A lei, que foi aprovada em 2016, proíbe a veiculação na rádio e na televisão, entre 6h e 21h, e em qualquer horário dentro do ambiente escolar de qualquer publicidade dirigida a crianças sobre alimentos e bebidas pobres em nutrientes e com alto teor de açúcar, gorduras saturadas e sódio.

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Em ação, rejeitada pelos magistrados, a Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert) contestava a medida sob o argumento de que o ente estadual não possuiria a competência para legislar sobre propaganda comercial e violaria princípios constitucionais como a liberdade de expressão comercial, o direito à informação e a livre concorrência.

O STF, entretanto, considerou a lei constitucional, validando a norma. O relator do processo, o Ministro Edson Fachin, embasou seu voto na resolução da Organização Mundial de Saúde, OMS 63/14, de 2010, que estabelece uma série de recomendações para alcançar uma alimentação de qualidade para crianças, como promover a conscientização dos consumidores sobre o tema e desenvolver políticas e programas escolares que incentivem as crianças a adotar e manter uma dieta saudável.

Segundo os dados da Pesquisa de Orçamentos Familiares – POF (IBGE, 2010), coletados entre 2008 e 2009, no país, 15% das crianças na faixa de 5 a 9 anos estavam obesas e 37% com excesso de peso. Entre 10 a 19 anos, as taxas de excesso de peso eram de 34,8% para meninos e 32% para meninas, e de obesidade eram, respectivamente, de 16,6% em meninos e 11,8% em meninas.

Nesse cenário, a publicidade pode ser um fator a estimular a obesidade infantil. A pesquisa Targeting Children With Treats (“Alvejando crianças com guloseimas”, em livre tradução do inglês), de 2013, aponta que as crianças que já têm sobrepeso aumentam em 134% o consumo de alimentos com altos teores de sódio, gorduras trans e saturadas e açúcar, quando expostas a publicidade destes produtos.

Por isso, Cláudia Montal, mãe de Marina, de 8 anos, nutricionista e membro da Ibfan (Rede Internacional de Ação de Alimentos para Bebês), acredita que a validação dessa lei seja tão importante para proteger o público infantil. “É fundamental, porque a propaganda tenta persuadir tanto as crianças quanto os responsáveis, e ainda temos uma questão mais preocupante: a gente está num cenário obesogênico”.

A nutricionista busca ensinar os filhos com receitas simples e fáceis através do exemplo. “A gente precisa procurar estimular as crianças a consumir alimentos mais saudáveis através do nosso exemplo como pais responsáveis e também com a explicação de porque faz mal, que doença pode trazer. A gente precisa ter a conscientização e um diálogo sempre”.

Já Priscila Chammas, ativista e mãe de Giovanna, de 2 anos e 8 meses, e Matheus, de 1 ano e 5 meses, acredita que a obrigação de controlar a alimentação das crianças deve ser apenas da família. “Aqui em casa sempre tem frutas, legumes e coisas saudáveis. É o que sempre ofereço, não ofereço o que não é saudável, mas, quando eles pedem, não faço com que pareça uma coisa inatingível, trato com naturalidade. Quanto mais alarde a gente fizer quando eles estiverem comendo algo que não devem, isso vai criar neles o desejo de comer mais, experimentar, comer escondido. A moderação vale para tudo, nunca proibi completamente, mas também não ofereço”.

A endocrinologista Renata Lago alerta, entretanto, que a obesidade é um problema de saúde pública, até mesmo em regiões de desnutrição, entre a população em vulnerabilidade social, e que uma criança com obesidade pode ser um adulto com menor expectativa de vida e com mais comorbidades, como diabetes, hipertensão, infarto e derrame precoce. “A publicidade faria o papel antieducativo. No momento em que se veicula a propaganda relacionada a produtos industrializados, que são ricos em gordura, ricos em sal, está se desfazendo, aquilo que se recomenda, que seria exatamente a educação no sentido de estimular o consumo de alimentos não processados”.

Segundo a especialista, para combater a obesidade, o ideal seria seguir as orientações da Organização Mundial de Saúde no quesito alimentação saudável. “O documento da OMS de 2010 aponta várias ideias, que implicam em educação nutricional, ou seja, a criança deve aprender a se alimentar de forma saudável, deve ser ensinada, então isso também é papel da escola, deve se estimular a atividade física e, obviamente, consumir alimentos saudáveis e diminuir o consumo de alimentos processados”.

Sobre o papel da escola, Nelson Souza, professor, advogado e dirigente do SINEPE- BA (Sindicato dos Estabelecimentos de Ensino do Estado da Bahia), salienta a vulnerabilidade das crianças para discernir fantasia e realidade no consumo de publicidade e reforça a importância das instituições de ensino no controle da alimentação infantil. “As escolas precisam ter responsabilidade na contratação das empresas ou das pessoas que vão administrar suas cantinas, porque muitas são terceirizadas. É preciso que haja conscientização e é necessária também a participação dos pais, porque não adianta a escola desenvolver uma educação alimentar quando em casa, muitas vezes, a criança vai na contramão”.

Sob a supervisão da jornalista Hilcélia Falcão | A Tarde

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